23 de junho de 2006

uma citação p/ tirar a poeira

Procuramos o conhecimento apenas por querermos deleite , e é impossivel
imaginar por que uma pessoa sem desejos nem medos se daria ao trabalho de
pensar.

Rousseau (Discurso sobre a origem da desigualdade)

10 de junho de 2006

Educação sentimental - especial dia dos namorados

Shrek e a vida real.
Esses dias em meio a alguns devaneios me coloquei a pensar sobre esse belo casal que descobriu o amor em meio aos aparentes defeitos.
Fiona uma *princesa* que presa em um castelo esperava ser salva por um príncipe de cavalo branco, olhos azul e corajoso, e depois eles viveriam felizes para sempre.
Shrek, um ogro que só queria ter paz em seu pântano, mas de – repente vê-lo invadido por personagens de desenho animado, e para ter seu pântano e sua paz de volta ele vai ter que resgatar a *princesa* para o suposto príncipe corajoso.
Princesa salva, dragão vencido e o caminho de volta. Onde nasce o amor real, com pessoas mais reais ainda. A princesa fica triste porque ao invés de um príncipe veio um ogro, só que a mesma também não é completamente uma princesa, ela também é uma ogra, e ele também não e completamente ogro.
Shrek é o típico macho, difícil de lhe dar, às vezes impaciente, porém sensível , ama a fiona de verdade, e tudo o que deseja é ser amado como é. Em suas conversas com o cupido burro ele diz “mas ela não gosta de min como eu sou”. E a princesa, a típica garotinha bem arrumada durante o dia, com imagem de boa mocinha delicada, e uma solitária ogra à noite esperando ser amada, e não adianta cem escovadas antes de dormir.
A idéia do príncipe e da princesa é construída no imaginário das crianças desde bem cedo. Não fico surpresa que as mulheres sempre esperam mudar seus parceiros e eles sempre esperam que elas não mudem nunca. É assim com a bela e a fera, aquela fera é transformada em um belo e perfeito príncipe, pela ação do amor que sente pela princesa, e ela é eternamente a boa moça , chegou boa moça ao castelo, transformou a fera em príncipe e permaneceu perfeita. Não são assim com os sapos, que após serem beijados viram príncipes perfeitos. Os contos não mostram os defeitos da princesa, só os do príncipe e quando mostram. Assim eles esperam que as mulheres nunca mudem, que sejam sempre dóceis, amáveis, boas esposas, e elas acreditam que vão mudá-los. Depois de alguns anos e tentativas frustradas é melhor entrar com a papelada do divorcio.
O autor de Shrek em uma tacada de mestre, faz uma sátira dessas histórias e traz para as crianças e adultos o que acontece de verdade, nada de príncipes e princesas , o amor é possível , mas entre pessoas de verdade, a moça não é bela o tempo inteiro e ele nem sempre tem olhos azuis , mas isso não impede que eles vivam esse belo sentimento que damos o nome de amor.
Enquanto meu ogro não vem, essa é minha homenagem aos apaixonados, que vocês consigam se amar e viver a plenitude desse sentimento levando em consideração as limitações e diferenças de cada um, respeitando o espaço um do outro e se moldando dia a dia por esse sentimento, capaz de mudar sim uma pessoa, mas não de fazer com que ela deixe de ser humana.
Ah, e agora chega , viva o amor.

8 de junho de 2006

Educação sexual

Sexo é coisa muito simples.

Eu explico os essenciais em poucas linhas. Mas, para que as explicações expliquem, é preciso começar no lugar certo.

Quem começa explicando o sexo falando sobre sexo explica errado. Sexo não começa nos genitais e nas coisas que eles fazem. Pra se entender de violino há de se começar com a música. Pra se entender o sexo há de se entender a música que ele toca.
Numa orquestra são muitos e diferentes os instrumentos. Cada um produz som de um jeito. Basta comparar um flautim com uma tuba. Mas todos tocam a mesma música. Todos querem produzir beleza. O corpo é uma orquestra. São muitas as suas partes, e diferentes. Mas todos tocam a mesma música.
A música que o corpo quer tocar chama se prazer. Freud disse. Mas não foi novidade ou descoberta. Freud só fez repetir o que muitos pensadores e poetas haviam dito antes dele. Freud só fez lembrar aquilo que havia sido esquecido.

Os instrumentos da orquestra do corpo são os órgãos.
Os órgãos todos , todos eles , têm uma função prática: são ferramentas. Os olhos são ferramentas para se ver o que está longe. Vejo caqui vermelho no caquizeiro. Se eu não tivesse olhos meu corpo passaria a um metro do caqui, indiferente. Mas os meus olhos vêem. Eles vêem, o corpo deseja. Querem comer o caqui. Mas o olho sozinho não come nada. O corpo convoca então um outro instrumento: a mão. A mão é uma ferramenta para segurar. A mão segura o caqui. O corpo dá ordens ao braço. Ele se movimenta leva o caqui a boca. A boca é outra ferramenta. Com a boca se come. A boca serve para colocar dentro do corpo aquilo que estava fora. A boca mastiga , os dentes são pilões. Os ouvidos são ferramentas que entram em funcionamento no mundo do sons, onde os olhos não entram. Ouvimos o despertador, o telefone, as noticias do rádio, a sirene da ambulância. O médico ouve as batidas do coração. O nariz por sua vez se move no mundo dos cheiros, onde nem olho nem ouvido penetram. O cheiro bom nos seduz a aproximação: as flores do jasmim , o churrasco, o perfume francês. Já, os odores, utilíssimos, nos dizem que algo está errado. Alguém deixou o gás aberto: perigo de explosão ou envenenamento! mau hálito: deve haver algo de errado com a boca ou com o estômago. Chulé: sinal de fermentação e micose no pé. Isso que disse desses órgãos vale para todos , todos tem uma utilidade.
Além disso esses mesmos órgãos e membros são Lugares de prazer. O olho tem prazer vendo o caqui , o por do sol, o rosto amado , o quadro. Os meus têm deleite pessoal nas telas de Monet. Pelos ouvidos entra a música , o ruído da chuva, o repicar de sinos distantes. Na boca os prazeres do vinho, do salmão, do grelhado com alcaparras, da jabuticaba. Cada órgão sente prazer de uma forma especial, que lhe é peculiar.
Entre os órgãos da orquestra do corpo estão os órgãos sexuais. Não há nada de especial que os distingua dos outros. Como os demais órgãos eles são fontes de prazeres. Os prazeres do sexo são variados. Vão desde uma sensação muito suave que até parece coceira de bicho de pé, e que chega a provocar riso, até um prazer enorme, explosão vulcânica que tem nome de orgasmo, e que deixam aqueles que por ele passam semimortos. Mas esse prazer vulcânico que muitos pensam ser o obejtivo do sexo, eu acho que é semelhante aos três ruidosos acordes ao fim de uma sinfonia: grandiosos , fantásticos , mas eles anunciam o fim da brincadeira. Há mesmo casos de os tais três acordes acontecerem mal a sinfonia começou. Não vejo vantagem nisso embora os galos e as galinhas pensem o contrário. Bom mesmo, é o bolero de Ravel , que vai devagar e demora para terminar.
Os órgãos do sexo tornam possível uma brincadeira entre dois parceiros. Brincadeira, sim. Cada corpo é um brinquedo. Brinquedo porque o outro brinca com ele. Brincar é divertido. Dá prazer. Dá alegria. Quando um parceiro sente que seu corpo é um brinquedo do outro, é como se o outro lhe dissesse: "O seu corpo é um lugar de alegrias para min". Sobre isso , aconselho sacerdotes, pastores e líderes espíritas a fazerem sermões e meditações sobre o livro cântico dos cânticos. Esse livro deveria ser o primeiro a figurar em qualquer bibliografia de educação sexual. A educação sexual começa com poesia e não com anatomia e fisiologia. Mas o corpo é um brinquedo brincante. Brinquedo que também brinca com o corpo do outro. Essa brincadeira entre dois parceiros termina com a união dos dois. Está dito no livro de gênesis "... e serão ambos uma só carne". A experiência da união dos corpos é uma experiência de prazer e alegria. Mas , mais do que isso: é uma experiência metafísica , como se naquele momento nos voltássemos a condição em que os inventores de mito deram o nome de androginia: o masculino e o feminino unidos , em um momento de incandescência erótica. Essa experiência pode ser representada matematicamente: com dois se faz um.

O sexo também tem uma função util. Os órgãos sexuais são ferramentas. Máquinas. Com eles se fazem criancinhas. Nos tratados de medicina que por serem científicos, não conseguem falar sobre prazer e alegria, os órgãos do sexo são definidos exclusivamente em função de sua utilidade: Aparelho reprodutor. Algumas religiões acham que o prazer sexual foi invenção do diabo - não acreditam que Deus pudesse nos dar prazeres!- acham que sexo é só maquina de reprodução- o prazer sendo uma fonte de pecados. Preferiam o sexo por dever e não por prazer. A produção de novos seres humanos é coisa útil, porque se isso não acontece a humanidade acabaria. Um filho é uma garantia de que, de alguma forma, haverá alguém para tomar conta das coisas que eu amo depois que eu morrer. Matematicamente essa função de reprodução pode ser assim representada: com dois se faz três.
Isso é tudo.
Viram como é simples? Sexo não é complicado.

Complicados são os pensamentos dos seres humanos sobre ele. Os homens por razões que não entendo, passaram a considerar o sexo como uma coisa vergonhosa. Segundo os textos sagrados já citados, a primeira coisa que Adão e Eva tiveram após comer uma fruta proibida , foi que seus olhos sofreram uma perturbação e aquilo que havia saído lindo das mãos do criador , ficou repentinamente , ridículo e vergonhoso: se cobriram com tangas e toalhas de figueira, porque tiveram vergonha da sua nudez. Voltaremos ao paraíso quando pudermos contemplar o corpo da mesma forma como o criador contemplou. Isso é algo que pode acontecer de forma efêmera, quando duas pessoas que se amam estão brincando sexualmente uma com a outra.

Texto de Rubem Alves

3 de junho de 2006

Ainda que pareça longa, é sempre curta

Não passa de um breve instante

Apenas um segundo que não se vê

Uma lágrima não sentida

Um piscar de olhos não percebido

Ainda que se queira continuar, seu fim é certo

É preciso pensar

O que fazer no caminho?

Parar

para sorrisos, abraços, aliviar o cansaço da jornada

Parar

"contemplar o mais simples amor"

Parar

"chorar pelo que parte"

Parar

" celebrar o que nasce"

Mas é preciso caminhar

Caminhar para o que é essencial

O que é essencial afinal?

Tudo corre tão rápido

Os carros passam

As pessoas passam

Outdoors na minha frente vendem felicidade

Os jovens se vestem de felizes e vão as compras

Vão comprar felicidade

A felicidade em roupas

A felicidade em pilulas

A felicidade sem consciência dos sentidos

A criança chora , o adulto chora

Solidão, ausência ou constante presença

Já não há mais dor

Apenas expectadores sem senti-la

O sangue se espalha nos telejornais

O preço da banana cai

E o banal, vira essencial

Mas, o que é essencial afinal?

No hospital a criança nasce

Na delegacia a mãe chora

Nos shopping as crianças querem mais

Na vida todos querem mais

Pena não saberem o que querem

Buscam (compram) e não encontram

Estão todos cansados

A morte chega

Mas, o que é essencial afinal?